GARANTIA ESTENDIDA E BASE DE CÁLCULO DO ICMS.

O valor pago pelo consumidor final ao comerciante a título de “seguro de garantia estendida” não integra a base de cálculo do ICMS incidente sobre a operação de compra e venda da mercadoria. Inicialmente, convém esclarecer que o “seguro de garantia estendida” é um contrato de adesão voluntária estabelecido entre o consumidor (segurado) e uma sociedade seguradora, sendo rotineiramente oferecido e comercializado pela empresa que vendeu a mercadoria, que intermedeia o negócio. Ressalte-se que essa modalidade de seguro foi inicialmente regulamentada pelo Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) por meio das Resoluções 122/2005 e 296/2013.

De acordo com tais regulamentos, essa espécie de seguro tem por escopo fornecer ao segurado/consumidor a extensão e/ou complementação de garantia original da mercadoria adquirida. Importa mencionar, ainda, que a Resolução CNSP 296/2013, em seu art. 13, esclarece expressamente que é “vedado condicionar a compra do bem à contratação do seguro de garantia estendida, assim como condicionar a concessão de desconto no seu preço à aquisição do seguro”. De outro lado, a base de cálculo do ICMS, segundo a Lei Kandir (LC 87/1996), é o valor da operação pelo qual se deu a circulação da mercadoria. O imposto, portanto, não está limitado ao preço da mercadoria, abrangendo também o valor relativo às condições estabelecidas e assim exigidas do comprador como pressuposto para a própria realização do negócio. Essa é a inteligência do inciso II do § 1º do art. 13 da LC 87/1996, o qual dispõe que devem integrar a base de cálculo: (a) os seguros, juros e demais importâncias pagas, recebidas ou debitadas, bem como descontos concedidos sob condição; e (b) o frete, caso o transporte seja efetuado pelo próprio remetente ou por sua conta e ordem e seja cobrado em separado.

Nessa linha intelectiva, destaque-se que a doutrina ensina que o ICMS deve ser cobrado sobre o prêmio de seguro relativo ao risco do transporte que é contratado e pago pelo vendedor (remetente) e exigido do comprador para a concretização do negócio, pois, nesse caso, tal quantia está compreendida no valor da operação. A par disso, e ponderando os elementos supramencionados, verifica-se que o “seguro de garantia estendida” não se subsume ao art. 13, § 1º, II, “a”, da LC 87/1996, pelas razões seguintes. A uma, o pagamento do prêmio dessa modalidade de seguro não deve ser exigido do comprador como condição indispensável para a aquisição da mercadoria. Isso porque o seguro em questão é de adesão voluntária, podendo, ou não, ser contratado diretamente pelo consumidor final. Além disso, o seguro não é pago pelo vendedor para depois ser exigido do comprador, na composição do preço da operação, para o fechamento do negócio; essa, sim, hipótese de incidência do art. 13, § 1º, II, “a”, da LC 87/1996. A duas, o seguro de garantia estendida, conforme dispõe o art. 1º da Resolução CNSP 122, de 3/5/2005 e o art. 1º da Resolução CNSP 296, de 25/10/2013, pode ser contratado pelo consumidor quando da aquisição do bem ou posteriormente, durante o prazo de garantia do 239 fabricante, o que denota que esse negócio jurídico, embora relacionado, é autônomo e subsequente à operação de compra, sendo possível a sua contratação depois de já circulada a mercadoria (fato gerador do ICMS), configurando, portanto, nova relação jurídica e, por isso, não pode compor o valor da operação anterior já concretizada. A três, porque os valores pagos pelo consumidor ao comerciante devem ser repassados à companhia seguradora por força contratual da parceria, não configurando, portanto, receita do varejista na espécie. Assim, a garantia estendida é estabelecida entre o consumidor e a empresa seguradora, inexistindo relação jurídico-tributária entre o fisco e o comerciante que possa imputar ao último o dever de recolher tributo sobre receita pertencente a terceiro, sob pena de afronta ao princípio da capacidade contributiva.

Entretanto, apenas, se o “seguro de garantia estendida” vier a ser indevidamente exigido pelo comerciante, como condição do negócio, a fim de reduzir, por meio de simulação, a base de cálculo do ICMS, poderá o fisco autuar essa conduta irregular do contribuinte com espeque no princípio da realidade (art. 116, I, do CTN). REsp 1.346.749-MG, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 10/2/2015, DJe 4/3/2015 (Informativo 556).

Fonte: STJ